25 de janeiro de 2012

Crise capitalista é uma crise civilizatória, defendem educadores no FST

Público lotou sala da Reitoria da UFRGS | Foto: André Carvalho/Sul21

Vivian Virissimo

“Um outro mundo é possível. Não estamos satisfeitos. Queremos um outro mundo com mais justiça social e ambiental”, resumiu nesta terça-feira (24) o conferencista Sérgio Haddad para uma platéia que lotava uma das salas da Reitoria da UFRGS, durante o Fórum Mundial de Educação, evento do Fórum Social Temático (FST).
“Essa crise mostra o fim do ciclo do capitalismo e do neoliberalismo que está levando a um retrocesso do processo civilizatório. Não é só uma crise econômica, é também social. Esse é um modelo que não conseguiu dar qualidade de vida para o povo”, falou o educador.
Com o tema Crise Capitalista: Causas, impactos e conseqüências para o mundo da educação, três conferencistas abriram o Fórum Mundial de Educação: o brasileiro Sergio Haddad, um dos coordenadores da Ação Educativa, a peruana Nélida Céspedes, do Conselho de Educação de Adultos da América Latina (CEAAL) e Aminata Diallo Bolu de Burkina Faso da International College of Advanced Education (ICAE).
O objetivo da conferência é fazer uma análise da conjuntura mundial de crise e do papel do mundo da educação para incentivar novos modelos de desenvolvimento. “A intenção é fazer uma reflexão do papel dos educadores frente à crise que se está desenvolvendo e os limites desse modelo que tem se mostrado insuficiente para resolver problemas sociais e ambientais”, explicou Haddad.

“O dilema é como sair dessa crise. Temos que achar luz onde está escuro", diz educador Sérgio Haddad | Foto: André Carvalho / Sul21

O contexto de análise são os recorrentes protestos anti-sistêmicos que vem ocorrendo com o movimento dos Indignados na Espanha, com os levantes da Primavera Árabe, com os acampamentos do Ocuppy Wall Street e com o movimento de estudantes no Chile. Segundo ele, esses movimentos demonstram que o modelo vigente se mostra insuficiente para a maioria dos povos, além de ser insustentável ambientalmente.
“Diversos movimentos brotaram e tratam de temas diretamente vinculados à crise. Os indignados criticam as altas taxas de desemprego e a forma com que a crise está sendo conduzida, a Primavera Árabe pede democracia e outras formas de governança, o Occupy critica a concentração de renda e os estudantes no Chile que fazem uma defesa da escola pública gratuita e de qualidade”.
Na avaliação de Haddad, todas essas convergências de movimentos internacionais não encontram eco nos movimentos populares brasileiros já que os reflexos da crise ainda não chegaram ao Brasil. “Nós educadores, que sabemos da gravidade da situação, sabemos que essa crise em algum momento vai chegar ao Brasil e temos que pensar como minimizar os impactos em relação a isso”, falou o educador.
“O dilema é como sair dessa crise. Temos que achar luz onde está escuro. Sabemos as causas, mas temos dificuldades de prever as alternativas. Esse receituário de cortar gastos, reduzir direitos não nos serve, é esticar o problema pra frente, empurrar com a barriga”, criticou Haddad.

“Uma pedagogia que combina com indignação”


Nélida Cespedes (d) e Aminata Diallo Boly participaram dos debates no Fórum Mundial de Educação | Foto: André Carvalho/Sul21

A educadora popular peruana, Nélida Céspedes, do Conselho de Educação de Adultos da América Latina (CEAAL) também destacou as lutas em nível local, regional e nacional que estão se desenvolvendo contra o sistema capitalista. “O mais perverso do sistema é que ele converte os cidadãos unicamente em consumidores. Isso deve ser combatido. Queremos lutar por uma nova humanidade, que se relacione melhor com os outros e com a natureza”, destacou.
Para colocar em prática uma democracia radical, Nélida acrescentou que o conjunto das lutas devem enfrentar a corrupção, o autoritarismo e violência de todos os tipos. “Nestes momentos de construção de um sistema democrático multicultural, precisamos de uma democracia radical que enfrente esta democracia formal. Estamos diante de uma crise de grande complexidade e ante uma crise de proporção civilizatória”.
Para uma plateia formada por educadores, Nélida também falou na necessidade de romper com esse sistema para construir novas alternativas. “Na realidade esse sistema se baseia numa irracionalidade, uma cultura patriarcal da supremacia do homem sobre a mulher, uma cultura monocultural que não assumiu a diversidade como um valor”.
Nélida reconhece que são muitas as perguntas e que as respostas ainda estão sendo construídas. “Temos que continuar aprofundando as perguntas, por exemplo, que paradigmas sustentam uma outra forma de educação? Os educadores estão construindo em nível local e nacional essas articulações necessárias para a justiça social?”, questionou Nélida, respondendo em seguida: “Parece-me que não, são ações muito parciais e fragmentadas. Os educadores estão trabalhando sem parar e desligados das lutas políticas”, criticou a peruana.

Debates no Fórum Mundial de Educação vão até a quinta-feira | Foto: André Carvalho/Sul21

“É um momento de afirmação, estamos convencidos que todas as partes do planeta estão construindo pensamentos alternativos, com uma educação libertadora e popular. Não podemos suportar que existam grandes supressões de direitos. Não há mudança sem um contexto político de grande participação, uma pedagogia que combina com indignação, rompendo com esta educação eurocêntrica”, finalizou a peruana.

“Vivemos um novo momento na resistência global contra o capitalismo”

A educadora Aminata Diallo Boly ressaltou que se vive um período de lutas de longo prazo e que a educação tem papel central nesta nova conjuntura. “Vivemos num mundo feroz. A elite capitalista que está na linha de frente é incapaz de reagir às questões sociais que surgiram ao mesmo tempo e com graves consequências no norte, sul, leste e oeste”, falou Aminata que é de Burkina Fasso.
Ela analisa que a crise econômica provocou a quebra de vários contratos sociais com diferentes públicos, inclusive sindicatos e educadores. “Esses contratos sociais foram fragmentados e tudo isso é resultado da busca de acúmulo financeiro por uma elite financeira, capitalistas que deixaram para trás quaisquer valores para o bem estar da população”.
Para romper com esse paradigma, Aminata destacou como fundamentais as lutas das mulheres feministas que questionam a relação patriarcal, além dos movimentos dos povos indígenas que estão na frente da luta em defesa dos recursos naturais. “Temos que aprender com a história. Os capitalistas não têm compromisso com princípios, apenas com a produção mais rápida, maior lucro, no menor tempo possível”, lembrou a educadora.
“Vivemos um novo momento na resistência global contra o capitalismo. Os educadores tem que corporificar o espírito dessa resistência para que avancem as lutas contra grandes países e ao lobby. Não vamos deixar o poder na mão do restante dos 99%.”

Sul21

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