Felipe Prestes
Os tentáculos do contraventor Carlos Cachoeira ganharam os holofotes
do Congresso com a adesão de centenas de parlamentares à criação de uma
Comissão Parlamentar de Inquérito, enquanto outra batalha contra a
corrupção se trava mais silenciosamente todas as quartas-feiras na
comissão que discute a reforma política na Câmara dos Deputados. A
reforma está emperrada por defensores do financiamento privado. Como as
gravações da Operação Monte Carlo evidenciaram que se trata de mais um
caso de corrupção que abastecia campanhas como a do senador Demóstenes
Torres (DEM-GO), deputados que defendem o financiamento público
acreditam que a tese ganha força.
“A proposta é mais atual do que nunca. Não sei quantos Carlinhos
Cachoeiras querem ver para saber que neste sistema atual até o dinheiro
do crime organizado tem facilidade de entrar na eleição”, afirma o
relator da Comissão, Henrique Fontana (PT-RS). “(O Caso Cachoeira)
dá uma força para o projeto, porque mostra com mais clareza que, além
do abuso de poder econômico feito de maneira legal, que torna
desequilibrada a eleição, o sistema de financiamento atual é uma espécie
de paraíso para o crime organizado e para o dinheiro da corrupção
entrarem para dentro da política”, complementa.
Fontana já está com o texto pronto há meses, mas não consegue colocar
em votação. Nesta quarta-feira (18), houve uma reunião que o petista
qualifica como difícil e disputada. “Um grupo de deputados que se opõe
ao financiamento público procura usar um conjunto de manobras
obstrutivas. Hoje, inventaram uma nova: a posição de que se fizesse uma
votação preliminar sobre sistemas eleitorais, de forma genérica, antes
de se apreciar o relatório”, relata. Com o impasse, não se votou nem uma
coisa nem outra.
“Quarta-feira que vem irei para um novo embate. Colocarei em votação
em todas as sessões, até ser votado”, avisa Fontana. “Como faz vinte
anos que o país precisa de uma reforma política, não posso me apavorar
por dez semanas a mais ou a menos”, diz.
Entre os parlamentares que têm feito manobras obstrutivas, se destaca
o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que tem sido uma espécie de líder
dos defensores do financiamento privado. “Ele está acostumado a fazer
campanhas caras, então tem medo de campanhas mais igualitárias”,
alfineta o relator da comissão. Fontana relata que o PMDB não está todo
fechado com Cunha. O deputado Alceu Moreira (RS), por exemplo, apoia o
financiamento público.
Para os defensores do financiamento público, o lado positivo das
reiteradas obstruções é que são um forte indício de que os adversários
da proposta temem ser derrotados. “Aqueles que, de fato, querem derrotar
o relatório estão sentindo que nós temos maioria na comissão. Por isto
criam alternativas para impedir a votação”, aposta Fontana.
É um bom momento para refletir sobre financiamento de campanha, avalia Freire
Durante a sessão desta quarta-feira (18), o presidente nacional do
PPS, deputado Roberto Freire, fez aparte para complementar o que
defendia Henrique Fontana. “O financiamento público de campanha é a
saída para escândalos como o que o país está assistindo, da ligação do
bicheiro Carlinhos Cachoeira com o Estado brasileiro”, afirmou. O Sul21
conversou com Freire sobre o tema após a sessão. O deputado reforçou
que o escândalo ajuda a votar o financiamento público de campanha. “Esta
CPI vai tratar, dentre outros fatos, da questão do financiamento
ilícito de campanha. É um bom momento para você refletir sobre como
enfrentar este crime, como enfrentar os processos de corrupção que daí
derivam”, disse.
Freire relatou que a defesa do financiamento público não é só dele,
mas uma posição do PPS, partido do qual faz parte também o presidente da
Comissão, Almeida Lima (SE). “O PPS tem posição a favor do
financiamento, permitindo a contribuição individual, de pessoa física,
filiada ao partido, e até um determinado limite. Tanto ele (Almeida
Lima) quanto o Fontana estão trabalhando muito para que tenha votação.
Que não seja mais uma comissão que não dê resultado. Fontana está
tentando convencer a casa a votar independentemente se aprovam ou não”,
conta.
O dirigente partidário afirmou que foi o primeiro deputado a
protocolar um projeto pelo financiamento público, há muitos anos, e, por
isto mesmo, considera difícil sua aprovação. “Você tem interesses que
não querem que se tenha maior transparência no processo eleitoral. Além
disso, há um preconceito na sociedade de que isto é algo que escorcha
ainda mais a população, como se não estivéssemos pagando um preço muito
mais caro por permitir que este tipo de financiamento viabilize negócios
escusos, às vezes muito mais caros”, disse.
Freire afirmou também que há “lideranças expressivas” que não se
posicionam claramente sobre o tema no Congresso e que outro obstáculo é a
visão que muitas pessoas têm de que isto não acabaria com o
financiamento privado, por baixo dos panos. “Então deixamos como está?”,
questionou Freire. “Com financiamento público você vai ter um controle,
uma fiscalização muito maior. Hoje, você tem que ter fiscalização de
milhares de candidatos”, disse. Mal comparando, o socialista lembrou que
o homicídio é crime, mas continua existindo e isto não torna a lei
obsoleta. “Se o financiamento for público continuar havendo ilícito”,
ressaltou.
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